sexta-feira, 30 de maio de 2008

Como Robinson



Voltei a blogueirisse depois de dias de solidão e árduo trabalho.

Outro dia, roubei uma coleção das mais antigas do meu pai dos livros de Julio Verne. Aquelas tiragens de livros que saiam na capa dura, ilustrações e linguagem pré-reforma da língua portuguesa. Um clássico. Um prestígio ler crases em O’s e C’s antecedendo T’s em casos diversos.

Não tardou e já estou devorando “Vinte Léguas Sub-Marinas” como o bolor avança nos livros velhos de cheiro tão atraente quanto saturado de fungos. O encanto pela obra foi inato, mas tenho que enfatizar o carisma de um personagem. O Conselho. Sim, o cara chama Conselho e é o mordomo do narrador. Se conselho fosse bom, ninguém dava de graça. Com Verne não é verdade e o Conselho é tão prestativo quanto o Alfred do Batman só que mais jovem e atento – seu amo, ao que parece, é um intelectual pouco viril e um tanto pedante.



Conselho é bom, mas não se compara com o maior dos ajudantes com nomes de verbetes. Sexta-Feira sim é um coadjuvante-substantivo campeão. Foi com Sexta-Feira que Robinson, o Crusué, sentiu o frescor da amizade em seu exílio. O antes selvagem, convertido a fiel capataz de um homem branco (invasor) da ilha deserta povoada por atrozes índios, mostra como colônia e colonizador podem se dar bem.

Sexta-Feira e Robinson deram liga a imaginação de todos. De Tom Hanks a Survivor, foi a dupla que inaugurou o cânone ilha deserta mais amizade mais muita confusão. Quem nunca sonhou com isso? Se bem que muitos pararam na delicinha da Lagoa Azul, o filme mais visto das tardes.

Essas fantasias sacudiram minha mente hoje quando eu li no BoingBoing que tem um maluco francês que vai fazer uma aventura digna de Robinson Crusué do século XXI. Sim, ele vai para uma ilha deserta no Pacifico passar uma temporada. Tudo solamente sozinho, com ferramentas primárias e, lá vem ela, uma câmera para registrar tudo! (mais um carregador de bateria integrado a um painel de captação de energia solar)

Absurdo! Infâmia! Podem dizer os mais aguerridos ao romance romântico e ao direito de culto a imagem sagrada que a prosa do DeFoe pintou na nossa mente. De fato, é apropriação sem escrúpulos de uma idéia que só era possível nos tempos sem tomada e GPS.



O nome do larápio é Xavier Rosset, francês e documentarista. Ele quer mandar tudo para o taipe para o rss e para os tubes da vida. E olha que a ilha é linda. Não me pergunte o porquê desse pequeno paraíso ser desabitado. Penso, logo, na existência de pterodátelos gigantes e moscas de um metro de altura. Coisas típicas dos Herculóides, trupe de heróis fantásticos que merecem uma versão cinematográfica – pelo menos pela sua ousadia de formatos e peripécias.



Com efeito, eu poderia ser esse Xavier. Todos nós poderíamos. Não sei como ele conseguiu financiamento e permissão para rodar tudo isso. Quem garante que ele não será perturbado durante esse tempo? Eu posso muito bem chegar lá de caiaque, como que não quer nada. Ou algum baleeiro japonês pode usa-lo como refém, em troca de umas baleinhas. Se for para ser Robinson, tem que ser naufrago. Tem que ter Sexta-Feira.

Mas também, caro amigo. Imagine se a moda pega e a peleja do homem versus a ilha da solidão vira terapia ou livro de auto-ajuda? Vejo os multimilionários do Bahrein, Emirados Árabes e companhia alugarem as ilhotas particulares de Dubai para o intento. Imagina o Richard Branson inaugurando a Virgins Empty Island, onde quem pagar mais de 20 mil dólares pode passar uns meses sozinho ou com a sua Sexta-Feira favorita. Vá lá.

Ser Robinson custa caro. Mas vai ter aquela situação em que você vai ter que confessar comigo: tem horas que todo mundo quer ser Robinson. O tempo de dar um tempo e esquecer tudo e todos. Partir para a ilha deserta, coisa tão banalizada hoje em dia, e tentar tirar leite da pedra e beber água da chuva, dormir na areia e não fazer a barba. Garanto que tem horas que a troca vale a pena.

Shot Sexta-Feira!

2 comentários:

Fernando Spuri disse...

Fantástico. Preciso muito de um companheiro verbete.
Pensei em Gilberto Clube Praga, Sony Shida ou Christopher Altoids.

O Herculóide preferido era o tricerátops que jogava bolotas de catota pelo chifre frontal. Sem menosprezar o Geléia Muito Louca e seu filho, geléinha.

José [Zeh] Eduardo disse...

Indeed, good sir.

Essa história de companheiro verbete é uma ótima pra vender publicidade.

"Quem é esse aí?"
"Ah, esse é meu amigo, o Coca-Cola."

Gosto da idéia de passar 300 dias numa ilha isolada, mas ele já está contaminado pelo ambiente normal. Isso é uma farsa. Além do que eu aposto que ele vai ser treinado antes de ir.. Essa bixa louca

Mas, oh well, quem tá fazendo isso é ele, não eu.

 
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